A violência presente na escravidão africana é um traço caraterístico que não pode ser desvencilhado do processo. A imagem demonstra os castigos públicos aplicados aos cativos. Execução da punição de açoitamento. Jean-Baptiste Debret. Disponível em: <https://noticias.r7.com/brasil/escravidao-e-o-assunto-mais-importante-da-historia-brasileira-as-reflexoes-de-laurentino-gomes-apos-percorrer-africa-para-trilogia-20112018>.
Apesar da aparente superação da herança discriminatória racial, o Brasil ainda necessita percorrer um longo caminho para alcançar uma verdadeira integração social e econômica. Sendo assim, discutir o contexto da escravidão africana se torna essencial nesse trajeto democrático.
O
processo de escravidão dos africanos no Brasil foi um dos mais violentos e
cruéis já existentes. Muito além de um modo de produção, a escravidão trata-se
de uma forma de relação entre pessoas.
Segundo Jaime Pinsky, qualquer tentativa de mostrar relações harmoniosas entre senhores e cativos apenas encobrem a perversidade e a crueldade do sistema que ainda reflete na estruturação social atual.
Iniciamos
nosso diálogo com a constatação de que o escravo negro foi trazido à força para
o território brasileiro. A existência de uma escravidão interna africana não se
assemelha à implantada pelos europeus na Era Moderna. Dentro da lógica
capitalista mercantil, o comércio de seres humanos era extremamente lucrativo.
O mercado de escravos era um ambiente comum nas grandes cidades coloniais. A venda de seres humanos era justificada pela falta de humanidade dos africanos. Escravidão no Brasil. Jean Baptiste Debret. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/especial-entre-o-brasil-e-a-africa-houve-uma-troca-forte-e-poderosa-alberto-da-costa-e-silva/slavery_in_brazil_by_jean-baptiste_debret/>
De que maneira podemos diferenciar a escravidão interna africana da mercantil europeia?
Na grande produção agrícola aqui implantada, era fundamental a utilização de pessoas que não tivessem vínculo geográfico e social com o local de produção (havia uma proposital mistura de etnias – guinéus, angolanos, bantus, sudaneses, minas etc.).
A agricultura extensiva no território brasileiro (açúcar e posteriormente café) era
extremamente cansativa: os escravos chegavam a trabalhar de 15 a 18 horas por
dia, com pouquíssimo tempo para a refeição (detalhe: os alimentos eram digeridos
com as próprias mãos no local de trabalho).
A “igualdade religiosa cristã” apenas reforçava o caráter paternalista da relação com os senhores (desde que obedecessem, seriam recompensados com a vida eterna). Os açoites (chicotadas), eram legalizados e incentivados pelo governo. Havia, inclusive, horários programados para os “castigos públicos” (no Rio de Janeiro, ocorria entre 9 e 10 da manhã).
A “igualdade religiosa cristã” apenas reforçava o caráter paternalista da relação com os senhores (desde que obedecessem, seriam recompensados com a vida eterna). Os açoites (chicotadas), eram legalizados e incentivados pelo governo. Havia, inclusive, horários programados para os “castigos públicos” (no Rio de Janeiro, ocorria entre 9 e 10 da manhã).
Os
escravos não aceitaram sua condição passivamente: inúmeras formas de
resistência foram realizadas (fugas, assassinatos de senhores, suicídio,
aborto, formação de quilombos etc.). No entanto, precisamos lembrar que a
abolição somente ocorreu por iniciativa do governo e de parte das camadas
privilegiadas do Brasil.
(Uerj 2017)
O anúncio exemplifica uma
prática que se tornou comum na imprensa brasileira no século XIX: a divulgação
de oferta de recompensas por escravos fugidos. Tal prática possibilita situar a
importância dessa mão de obra em diversas atividades econômicas.
A partir das informações do anúncio, identifique
duas características da condição de vida dos escravos, no Brasil, naquele
momento. Indique, também, a principal transformação no mercado de compra e
venda de escravos ocorrida em 1850 que justifique o pagamento de uma
recompensa.
O
longo e gradual processo abolicionista pouco alterou a vida dos escravos até a
libertação definitiva em 13 de maio de 1888 (Lei Áurea).
Seja por pressão internacional, como a primeira lei (Eusébio de Queirós – 1850), ou por grupos abolicionistas (Lei Rio Branco, conhecida como “Ventre livre” – 1871), tais regulamentações não trouxeram um impacto significativo na reformulação social do sistema escravista.
Seja por pressão internacional, como a primeira lei (Eusébio de Queirós – 1850), ou por grupos abolicionistas (Lei Rio Branco, conhecida como “Ventre livre” – 1871), tais regulamentações não trouxeram um impacto significativo na reformulação social do sistema escravista.
A tortura e a crueldade da escravidão representada pelo duplo açoite dos escravos (observe também o fundo da imagem). A posição fetal do escravo do primeiro plano também representa a agressão psicológica. Jean-Baptiste Debret. Disponível em: <https://istoe.com.br/debret-radical/>.
(Fuvest 2018) Em 14 de maio de 1930 um jornalista argentino
compôs a seguinte crônica referindo-se à abolição da escravidão
no Brasil:
Hoje almoçando na companhia
do senhor catalão cujo nome não vou dizer por razões que os leitores podem
adivinhar, ele me disse:
– 13 de maio é festa
nacional...
Ah! É mesmo? Continuei
botando azeite na salada.
– Festa da abolição da
escravatura.
– Ah, que bom.
E como o assunto não me
interessava especialmente, dedicava agora minha atenção a dosar a quantidade de
vinagre que colocava na verdura.
– Semana que vem fará 42
anos que foi abolida a escravidão.
Dei tamanho pulo na
cadeira, que metade da vinagreira foi parar na salada...
– Como disse? – repliquei
espantado.
– Sim, 42 anos, sob a
regência de dona Isabel de Bragança, aconselhada por Benjamin Constant. Dona
Isabel era filha de Dom Pedro II.
– Quarenta e dois anos? Não
é possível...
– 13 de maio de 1888, menos
1930: 42 anos...
– Quer dizer que...
– Que qualquer negro de 50 anos
que você encontrar hoje pelas ruas foi escravo até os 8 anos de idade; o negro
de 60 anos, escravo até os 18 anos.
– Não será possível! O
senhor deve estar enganado. Não será o ano de 1788... Olhe: acho que o senhor
está enganado. Não é possível.
– Bom, se não acredita em
mim, pode averiguar por aí.
Roberto Arlt. Águas_fortes cariocas. Rio de Janeiro:
Rocco, 2013. Tradução: Gustavo Pacheco.
a) Identifique e explique o estranhamento do
cronista argentino.
b) Aponte e explique duas características do
processo de abolição da escravidão no Brasil.
Habilidades da BNCC desenvolvidas:
- Identificar diversas formas de violência (física, simbólica, psicológica etc.), suas principais vítimas, suas causas sociais, psicológicas e afetivas, seus significados e usos políticos, sociais e culturais, discutindo e avaliando mecanismos para combatê-las, com base em argumentos éticos (Ensino Médio).
- Analisar situações da vida cotidiana, estilos de vida, valores, condutas etc., desnaturalizando e problematizando formas de desigualdade, preconceito, intolerância e discriminação, e identificar ações que promovam os Direitos Humanos, a solidariedade e o respeito às diferenças e às liberdades individuais (Ensino Médio).
- Identificar os mecanismos de inserção dos negros na sociedade brasileira
pós-abolição e avaliar seus resultados. / Discutir a importância da
participação da população negra na formação econômica, política e social do
Brasil (9º ano)
- Identificar
e relacionar aspectos das estruturas sociais da atualidade com os legados da
escravidão no Brasil e discutir a importância de ações afirmativas (8º ano)
- Discutir o conceito
de escravidão moderna e suas distinções em relação ao escravismo antigo e à
servidão medieval. (7º ano)
Refletindo sobre tudo isso, o que você pensa sobre a lei Áurea? Ela conseguiu resolver esses
problemas? De que maneira a situação atual dos negros se relaciona com o
processo abolicionista?
Comente, critique,
faça parte você também deste blog!
Referências:
BENCI, Jorge. Economia cristã dos senhores no governo de escravos. 1705. 2a.
edição, preparada, prefaciada e anotada por Serafim Leite. Porto: Livraria
Apostolado da imprensa, 1954.
FERLINI, Vera Lúcia Amaral. Terra, Trabalho e Poder: o
mundo dos Engenhos no Nordeste colonial. Bauru:
EDUSC, 2003.
PINSKY, Jaime. A escravidão no
Brasil. Contexto: São Paulo, 2000.
SCHWARTZ, Stuart B. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial,
1550-1835. Trad. Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
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